quarta-feira, 1 de fevereiro de 2012

Fatura comercial e o incoterms


Por Samir Keedi*

Como sabem aqueles que praticam o comércio exterior no Brasil, a dificuldade é imensa em nossas plagas (sic). Sendo importador, então, parecemos outro mundo. Não bastasse os problemas com o governo brasileiro, via Receita Federal do Brasil, existem as questões operações. Que têm o dom de atrapalhar. E, algumas, não entendidas pelos nossos exportadores estrangeiros. Que tem lá seus sistemas operacionais para o mundo. E nossas “peculiaridades” só servem para incomodá-los. Além de não permitir que as coisas aqui funcionem como no mundo desenvolvido.

Uma delas é a emissão da fatura comercial da nossa importação. Que tem que ser emitida de forma peculiar. Outra de nossas invenções. E que tumultua o Incoterms. Em que todos sabemos, que numa compra e venda, tem o seu preço fechado. Em qualquer dos seus termos. Seja lá qual versão for do Incoterms. Em que também, na importação, o único Incoterms permitido é o último, a versão atual. Com exceção da versão 2000 que nunca esteve no siscomex. Passou em branco no Brasil. Entre 01/01/1990 e 15/09/2011 só esteve no siscomex a versão 1990 do Incoterms. Agora temos a 2010.
 
Preço fechado significa que o vendedor cota um preço de venda pelo total da operação. Sem mostrar ao comprador como ele foi composto. Numa operação CIF, por exemplo, o vendedor cota um preço de venda, digamos, de US$ 1210.00. Este preço pode ter sido composto por um valor da mercadoria (VMLE – valor da mercadoria no local de embarque) de US$ 1,000.00, com frete de US$ 200,00 e prêmio de seguro de US$ 10.00.
 
O valor mostrado ao comprador deve ser de US$ 1,210.00 e nada mais. Não deve interessar ao comprador o valor de cada parcela. Mas, na importação, é exigido que se destaque na fatura comercial os valores de frete e seguro. Está no R.A. – Regulamento Aduaneiro, em seu artigo 557. Se não estiver destacado, o importador pode ter problemas e ser penalizado pela emissão da fatura de forma inadequada. Ou ilegal, já que o R.A. é lei.
 
E nem precisa. Quanto ao frete, de qualquer maneira, o comprador fica sabendo pelo conhecimento de embarque. Que no Brasil não pode vir “as per agreement”. Tem que ser mencionado, em face do artigo 575 da Lei 556/1850, o Código Comercial Brasileiro. Quanto ao seguro, o valor está na apólice ou certificado de seguro.
 
O mínimo que se esperaria, portanto, é que fosse uma lei única. Que todos fossem obrigados a segui-la. E que todos os fiscais a respeitassem. No entanto, sabemos que não é assim que funciona. Alguns importadores têm a fatura comercial emitida de forma adequada. Outros não. E, o mesmo com os fiscais da RFB. Alguns a aplicam. Outros não. Ocorrendo aquilo que todos sabemos, e que sempre falamos. No Brasil, cada fiscal é uma Receita Federal. Inadmissível.
 
Prova disso é que, em 2009, ao sair o novo R.A., houve uma corrida ao assunto. Com os fiscais olhando a fatura. E com os importadores nos perguntando como fazer a fatura com esta nova exigência. O que tínhamos a dizer a todos era que, não havia nada novo. Que isso já estava no R.A. anterior, de 2002. Que a única e irrelevante diferença, é que no de 2002 se falava em frete. E no de 2009 em custo do transporte. O que nada mudou. É questão de semântica apenas.
 
O que tinha ocorrido, tão somente, é que, ao passar do tempo, muitos a esqueceram. E que, ao sair um instrumento novo, todos a leram, e recomeçaram os problemas. Claro, por algum tempo. O que faz do Brasil um país sui generis. Único. Em que ocorre, e se diz abertamente, que há lei que pega e lei que não pega. Como assim, brejeiro? Lei é lei. Não tem essa de pegar ou não pegar. Tem que cumprir e pronto.
 
Claro, sem apontar o problema de redação. O inciso XII do artigo 557 do R.A. reza que se deve mencionar o “custo de transporte a que se refere às mercadorias especificadas na fatura. Os problemas iniciais foram mais longe, incompreensivelmente. Os fiscais estavam exigindo dos importadores que a fatura mencionasse, sempre, o valor do transporte (frete) e de outras despesas.
 
Não importando o Incoterms. Mesmo nas faturas, por exemplo, do Incoterms FOB. Hilariante, pois sendo FOB, o vendedor não contrata nem paga o frete internacional. Isso é de obrigação do comprador. O vendedor não tem como colocar isso na fatura comercial. Por desconhecimento desse valor e, especialmente, por não fazer parte do seu preço de venda. Assim, colocar frete numa fatura FOB é erro crasso. E, claro, certamente, passível de problemas por erro de emissão. Levou algum tempo para que isso fosse entendido. E tudo que era preciso, já que se fez uma nova lei, é que esse item tivesse sido adequadamente redigido. Que os redatores conhecessem mais profundamente o assunto Incoterms.
 
*Samir Keedi é Professor, Bacharel em economia, autor de vários livros em comércio exterior, transporte e logística, membro da CCI-Paris na revisão do Incoterms 2010.
 
Fonte: Revista Mundo

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